9 de julho de 2020

O BIS DA DISCÓRDIA


Certeza que quem inventou o chocolate Bis era um cara ruim, uma alma sebosa que trabalhava na vibe da maldade. “Quem come um pede Bis” diz a propaganda. Que gênio do mal cria uma comida que é “impossível comer um só” (ok, esse é o slogan da batata, eu sei)?

Uma vez vivi uma experiência antropológica por causa desse chocolatinho do mal. Trabalhava num escritório onde tinha um senhorzinho, seu Aurélio (era tipo um faz-tudo), com mania de fazer gentileza do jeito errado. Funcionário exemplar, era o primeiro a chegar para voluntariamente preparar o café e, como bônus de bondade, deixava um (apenas um!) Bis em cada mesa. Imagino que o senhorzinho comprava o chocolate de fardão, pois éramos em mais ou menos 10. Se tem 20 numa caixa, o mimo custava 10 caixas por mês (se não me falha a matemática).

Sei que quem comia aquele Bis solitário não trabalhava o resto do dia. Ficava naquela fissura do próximo e não conseguia se concentrar em nada. Eu, como tenho ascendente em virgem e sou organizado pá dedéu, tinha uma estratégia: guardava tudo e comia os cinco na sexta-feira. Fazia isso por ordem de chegada pra começar a comer do mais murcho para o mais crocante.

A coisa ficou feia quando um gaiato chegou mais cedo e resolveu dar uma de Cachinhos Dourados. Aproveitou que ninguém estava presente e rapou as mesas. Na minha cabeça, o meliante foi saltitando, de mesa em mesa, abocanhando as barrinhas de uma vez só, com a boca toda lambrecada de chocolate. Quando chegamos, nada do mimo. Ninguém quis ser indelicado e perguntar: “E aí, seu Aurélio, cadê aquele Bis maroto?”, mas, no final do expediente, ele veio com a pergunta que fazia todos os dias: “Comeu o docinho?”. Entendemos, então, que tinha um larápio entre nós.

Bem, o caso repercutiu a ponto de chegar à diretoria. Foi convocada uma reunião geral e, em vez de encontrarem o culpado, baixaram um decreto que proibiu deixar guloseima à mesa de trabalho – e ainda mais presentear alguém com qualquer coisa potencialmente viciante. Acreditem, um dos mandachuvas chegou a pedir a cabeça do velhinho alegando que seus hábitos bondosos estavam causando a discórdia da equipe. Logo essa ideia se dissipou, pois lembraram que era do seu Aurélio a nobre responsabilidade de preparar o cafezinho.

Gentilezas devidamente proibidas, a empresa seguiu dando lucro com todo mundo focado e sem distrações. Coisas que aprendemos no mundo corporativo.

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ASSALTO DESLEIXADO (Breja de Paulista)

  - Fui assaltado ontem... - Sério? Você tá bem? - Tô bem. Levaram só o celular. - Que sacanagem, cara. - Normal, hoje em dia, roubo...